História natural
Calcula-se que os tubarões existam há cerca de 450 milhões de anos, sem grandes alterações em sua
morfologia, o que sugere um bom nível de
adaptação e
evolução. Ocuparam diversos
nichos ecológicos, desde os
mares tropicais aos oceanos
Ártico e
Antártico.
Estes seres providos de estrutura corporal hidrodinâmica são criaturas importantes em quase todos os
ecossistemas marinhos. A quase totalidade dos tubarões é marinha, carnívora e
pelágica, habitando águas costeiras e oceânicas da maioria dos mares e oceanos, quer na sua superfície, quer na sua profundidade.
São conhecidas cerca de 400 espécies em todo o planeta, cujos tamanhos podem variam entre os 0,10 m e os 18 m de comprimento.
No
Brasil, existem 88 espécies de tubarão conhecidas.
Reprodução
A reprodução dos tubarões ocorre por fecundação interna, na qual o macho introduz o órgão reprodutor masculino (
clasper) no órgão copulador feminino (
oviducto) da fêmea.
As fêmeas atingem, em geral, a sua maturidade sexual com maior tamanho do que os machos e normalmente procriam em todos os anos.
Nas espécies
ovíparas, que correspondem a cerca de 20% do total, a fêmea realiza a postura dos ovos retangulares, protegidos por uma membrana filamentosa, de modo a fixá-los ao substrato marinho.
Nas espécie
ovovivíparas - cerca de 70% -, o desenvolvimento dos ovos ocorre no oviduto da fêmea, sendo as crias expulsas já desenvolvidas.
Nas espécies
vivíparas - cerca de 10% -, o desenvolvimento do
embrião realiza-se internamente, com ligações
placentárias, sendo as crias também expulsas já desenvolvidas.
A
seleção natural dos tubarões inicia-se, nalgumas espécies ovovivíparas e vivíparas, no próprio meio intra-uterino, através da prática do
canibalismo. As crias que se formam primeiro - num número entre quatro a quinze - e providas de dentes afiados, ingerem, na sua vida uterina, os embriões em formação e, posteriormente, devoram-se umas às outros, sobrevivendo apenas as mais fortes e aptas.
[carece de fontes]
Em maio de 2007 provou-se que o tubarão pode se reproduzir assexuadamente. Esta situação é rara nos espécimes selvagens.
Pele e escamas
A
pele dos tubarões é protegida por
escamas placóides, com dentículos dérmicos, que lhes conferem uma superfície muito áspera.
Possui ainda quimio-receptores, os quais possibilitam aos tubarões determinar se há substâncias nocivas na água, avaliar a
salinidade e outros parâmetros químicos.
Órgãos dos sentidos
Visão
Alguns cientistas crêem que, como muitos outros peixes, os tubarões são
míopes, estando a sua
visão adaptada apenas para distâncias entre 2 e 3 metros, embora possa ser utilizada para distâncias de até 15 m com um menor grau de definição. Contrastando com essa informação, outros pesquisadores acreditam que a
lente dos tubarões está fortemente suspensa por um ligamento dorsal, e fica normalmente fixada para a visão à distância; para a visão próxima ela é movida para frente pela tração de um pequeno
músculo protrator, fixo à lente. Investigadores da
Universidade de Queensland e da Universidade de West Austrália ainda sugerem que os tubarões são
daltónicos.
A abertura
pupilar varia de circular a oval quando aberta. Na luz brilhante a pupila pode ser apenas um pequeno círculo ou fenda, que pode ser vertical ou horizontal. O seu
olho possui uma camada reflectiva, a qual permite um aproveitamento superior da luminosidade em locais com pouca luz, como as águas turvas ou profundas e à noite.
Olfato
o olfato do tubarao é extremamente apurado, permitindo-lhes identificar substâncias bastante diluídas na água, como concentrações de sangue abaixo de 1 parte por milhão - o que equivale a perceberem-se de uma gota de sangue a 300 m de distância em pleno oceano. Por esta razão são por vezes designados como "narizes nadadores". Quando detectam o cheiro de sangue ou de corpos em decomposição, facilmente encontram o local de origem, utilizando principalmente o seu olfato (ou a visão para distâncias inferiores a 15 m).
Audição
A sua grande sensibilidade às vibrações, provoca comportamentos semelhantes. O seu
ouvido interno, responsável pelo
equilíbrio e detecção das
vibrações de baixa frequência, situa-se postero-superiormente ao
olho. Possui três canais semicirculares e detecta vibrações a longas distâncias, podendo o tubarão se aperceber do som de um peixe a debater-se a uma distância de 250 a 650 m. Em conjunto com o olfato, esta sensibilidade às vibrações, são os primeiros mecanismos utilizados na detecção de potencial alimentação. Uma vibração desconhecida, tanto pode provocar curiosidade como medo ao tubarão.
Linha lateral
As suas
linhas laterais são também capazes de captar vibrações de média e baixas frequências, correntes, mudanças na
temperatura e
pressão da água, assim como localizar obstáculos e alimentos em águas turvas. Do mesmo modo, pode também detectar, pela turbulência causada, a aproximação de um inimigo de grande porte.
Ampolas de Lorenzini
A cabeça, especialmente ao redor do focinho, apresenta pequenos
poros, denominados
ampolas de Lorenzini. Estes receptores são sensíveis à temperatura, salinidade e pressão da água, com uma especial capacidade para detectar
campos eléctricos muito sutis, gerados por outros animais. Podem, deste modo, detectar o
batimento cardíaco de um peixe que esteja enterrado na areia, a alguns metros de distância. A capacidade de perceberem estas ligeiras mudanças na corrente elétrica do ambiente, além de facilitar a caça às suas presas, possibilita-lhes a navegação em mar aberto durante as grandes migrações, guiando-se através do
campo electromagnético da
Terra.
Respiração e natação
A maioria dos tubarões, quando parados, não conseguem bombear a água para as
brânquias, de modo a respirarem. Necessitam, portanto, forçar a entrada da água pela boca, para que passe pelas brânquias e saia pelas fendas branquiais. Por outro lado, a ausência de
bexiga natatória, um órgão hidrostático existente noutros animais, dificulta a sua flutuação. Estas duas características são as responsáveis pela maioria dos tubarões nadar incessantemente, pois, se por algum motivo pararem, afundam e/ou morrem por asfixia. No entanto, algumas espécies conseguem permanecer paradas e deitadas no fundo do mar, inclusivamente dentro de grutas espaçosas, ao aproveitarem as correntes que aí existam.
A caça por suas barbatanas, podem ocasionar sua morte, pois sem a barbatana os tubarões perdem a hidrodinâmica necessária e os faz afundar.
Temperatura e hábitos de alimentação
Os tubarões, em sua maioria, são animais
ectotérmicos, pelo que a temperatura do seu sangue é variável e dependente do ambiente externo. Muitos tubarões, apresentam um menor
metabolismo, sendo mais lentos e com menores necessidades energéticas. Para manter a sua temperatura constante e um bom grau de atividade, dependem de águas tropicais quentes e das regiões costeiras. Alguns tubarões da ordem dos
Lamniformes possuem a capacidade de conservar o calor metabólico e manter a temperatura de regiões importantes do corpo constantes através de adaptações anatômicas, mantendo a temperatura do corpo maior do que a da água.
O deslocamento natatorial constante origina um enorme gasto de energia e uma consequente necessidade em se alimentar constantemente. Devido a essa voracidade natural, algumas espécies limpam os oceanos ao comerem os animais feridos ou mortos, mesmo que em elevado estágio de decomposição. A quase totalidade das espécies também rouba as presas de outros tubarões, quando surge a oportunidade. Quanto às suas preferências alimentares, seguem uma dieta regular de
peixes,
crustáceos,
lulas,
polvos,
tartarugas,
raias e outros tubarões, sendo o canibalismo uma prática muito comum. A prática da caça é guiada e determinada basicamente pela combinação dos seus sentidos. No entanto, os padrões de comportamento na procura de alimento variam de forma substancial. Num padrão normal, os seus movimentos costumam ser lentos e determinados; outras vezes, são compulsivos e rápidos. Na realidade, estes padrões quanto à natação, aproximação e ataque final, variam de
espécie para espécie e conforme as situações particulares.
A sua
boca, em posição ventral, possui uma grande abertura, graças à inexistência de contato rígido com o
crânio. Os
dentes, triangulares, afiados e extremamente eficientes para agarrar e cortar, não possuem raiz. São providos de várias fileiras de dentes de reposição, dispostas posteriormente à fileira que está em uso. Quando um dente é perdido, posterior move-se para ocupar o seu lugar. Algumas espécies não possuem os afiados dentes triangulares, essenciais aos
predadores, dado terem-se adaptado a outras formas de alimentação.
Papel do tubarão no ecossistema
Os tubarões exercem duas funções primordiais no ambiente marinho. Como predadores situados no topo da
cadeia alimentar, mantêm o controle populacional das suas presas habituais e são um instrumento da
selecção natural, ao predar os mais lentos e os mais fracos.
Ao contrário da cadeia alimentar terrestre, na qual os
herbívoros podem apresentar um porte maior que os
carnívoros, a hierarquia nos oceanos é basicamente determinada pelo tamanho. Os estratos da cadeia alimentar são denominados de
níveis tróficos. Quanto mais distante da base, a qual é formada pelos
produtores primários, maior o nível trófico.
No final dos anos 1980 do
século XX, a pesca excessiva de algumas espécies de tubarão na
Austrália, originou um aumento da população dos
polvos, o que por sua vez, com os polvos a predarem as
lagostas em quantidades acima do habitual, originou uma série crise na indústria da pesca da lagosta.
Por outro lado, quando os tubarões se alimentam de animais e peixes doentes, feridos ou mortos, contribuem para a manutenção da salubridade dos oceanos. Embora possuam um
sistema imunológico primitivo, apresentam uma baixa
incidência de doenças em geral, raramente contraem
infecção após
ferimentos graves e raramente desenvolvem
neoplasias.
Contribuições dos tubarões para a saúde humana
Além da contribuição
energética através dos pratos de
culinária que utilizam o tubarão (por exemplo, o
ambotic), existem conhecidas contribuições
farmacêuticas.
A
vitamina D foi obtida do óleo de fígado de tubarão (e de
bacalhau) até
1947, altura em que passou a ser sintetizada em laboratório. O óleo é também eficaz no tratamento paliativo das
hemorróidas. Alguns estudos indicam que este óleo contribui para a produção de
leucócitos nos seres humanos.
Em
1916, um cientista
japonês isolou deste óleo um
hidrocarboneto denominado
esqualeno, até hoje empregue nas indústrias
cosméticas e farmacêuticas, como base para
cremes de beleza,
pomadas e
medicamentos.
Alguns
ácidos polinsaturados extraídos do
fígado têm sido utilizado como
anticoagulantes no tratamento de
enfartes do miocárdio.
Por outro lado, o extrato da sua
cartilagem tem vindo a ser utilizado em
doenças osteo-articulares e no tratamento de
queimados.
Experimentalmente, têm sido feito
transplantes de
córnea para
olhos humanos, estudos relativos à
proteína esqualamina - encontrada no
estômago, fígado e
vesícula biliar - quanto à sua capacidade de inibir
tumores cerebrais, bem como a um
lípido quase onipresente nas suas células e com um poder
antibiótico de largo espectro.
ATAQUES DE TUBARÃO
Das 400 espécies de tubarão que habitam os
oceanos, 33 já atacaram comprovadamente o homem. Destas 33, 18 encontram-se em registros de ataques não provocados, embora este número desça para 3 espécies se considerar apenas o último século (registros entre
1907 e
2002).
A maioria das espécies só ataca um
ser humano quando acredita que o seu
território está a ser invadido, tal como faria com outro tubarão. Das 1848 ocorrências documentadas de ataques não provocados ao homem, 75% não estava relacionada com a
alimentação, mas sim com este fator.
As três espécies potencialmente perigosas para o homem são
Carcharodon carcharias (tubarão-branco) - tornado famoso em
1975 pelo filme
Tubarão de
Steven Spielberg -,
Carcharhinus leucas (tubarão-touro ou tubarão cabeça-chata) e
Galeocerdo cuvier (tubarão-tigre).
A biologia e os hábitos destas três espécies têm sido extensivamente estudados. Entre si, apresentam dietas, estratégias de caça e padrões de comportamento distintos.
A interação entre o homem e o tubarão, só acontece quando este está a nadar ou
surfar nas águas costeiras. Uma grande percentagem dos ataques não provocados deve-se a um erro de identificação, que pode ocorrer em animais mais jovens, condições de baixa visibilidade, como águas escuras ou turvas, períodos da alvorada e
crepúsculo, ou em ambientes de água agitada.
O tubarão-branco não se comporta como foi mostrado no referido filme de terror sendo, salvo raras excepções, o seu ataque ao ser humano devido a um erro de identificação. Os surfistas e mergulhadores, quando vestidos com roupas de
neoprene, podem ser confundidos com
focas, uma das presas habituais desta espécie.
Já o tubarão-touro ou cabeça-chata, além do ataque por erro de identificação, podem considerar as suas vítimas como invasoras, dado ser muito territorialista. Mesmo que o ser humano não se aperceba, o tubarão pode se sentir acuado ou que a sua área territorial está a ser invadida pela presença humana.
Os ataques do tubarão-tigre estão normalmente relacionados com a sua caça às tartarugas marinhas, que se dirigem para a costa, de modo a se alimentarem e desovarem. O ataque ao homem pode ocorrer quando o tubarão, com a visão contra ao sol, confunde os surfistas e banhistas com as tartarugas.
O ataque não provocado mais comum, denominado
hit and run, ocorre mais frequentemente nas zonas de
arrebentação com banhistas e
surfistas. As provocativas e falsas vibrações (
natação, surf, etc), e/ou enganosas atracções visuais (objetos e aparências humanas, como adereços brilhantes,
roupas de banho coloridas ou o contraste de bronzeamento entre a perna e a planta do pé), podem originar que o tubarão confunda o homem ou parte dos seus membros com as suas presas. A vítima raramente consegue ver o seu agressor e o tubarão não costuma retornar após a primeira mordidela, muitas vezes inquisitória - o tubarão utiliza os seus dentes para identificar a textura, sabor e consistência do que está a morder, sem empregar a potência total da mordidela. Suspeita-se que o tubarão, durante a mordidela, identifica que o ser humano é um objeto estranho ou muito grande e, tão rápido quanto mordeu, solta a sua vítima e não volta. As lesões provocadas por este tipo de ataque ocorrem, com maior frequência, nos membros. Costumam limitar-se a áreas restritas, raramente provocando fatalidades quando a vítima é rapidamente resgatada da água e os primeiros socorros executados adequadamente para evitar uma grande
hemorragia. Cerca de 90% das mortes ocorrem por
afogamento secundário, provocado pelo choque que advém da falta de controle da hemorragia.
Apesar da maioria dos ataques de tubarão se dar sem nenhuma provocação - cerca de 86% -, outros se dão quando são provocados. Entre as provocações mais frequentes, encontram-se o arpoar, tocar, segurar a cauda, oferecer comida, bloquear a sua passagem ou qualquer outra ação que importune o tubarão.
Turismo/mergulho para alimentação de tubarões
Proibida na
Florida, esta atividade tem proliferado nas últimas décadas nas
Caraíbas, como nas
Bahamas. Estes tubarões passam a associar o barulho do motor e a movimentação dos mergulhadores com a oferta de comida. Alguém que, inadvertidamente, pare o seu barco e mergulhe no mesmo local, pode vir a ser atacado por um tubarão mais impaciente e frustrado por não ter sido alimentado naquele momento, como já estava condicionado.
Fotografia Zito Colaço